No Brasil, a entrega de uma intimação judicial a um paciente internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é uma situação delicada e deve respeitar princípios legais e éticos. Não há uma norma legal específica que proíba expressamente a entrega de intimações em UTIs, mas essa prática deve ser analisada à luz de vários princípios constitucionais e legais.
Princípios Constitucionais Relevantes
- Dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal): deve-se garantir respeito à condição de saúde do indivíduo.
- Direito à saúde (art. 6º e 196 da Constituição Federal): qualquer ação que possa agravar o estado de saúde do paciente deve ser evitada.
- Direito à intimidade e à privacidade (art. 5º, X, da Constituição Federal).
Código de Processo Civil (CPC)
O CPC (Lei nº 13.105/2015) prevê, em seu artigo 248, § 2º:
“Não se fará a citação, salvo para evitar o perecimento do direito:
I – a quem estiver participando de ato de culto religioso;
II – a quem estiver doente, se o fato for notório ou estiver comprovado por declaração de médico.”
Esse artigo pode ser aplicado analogicamente às intimações, sobretudo quando se trata de pacientes em estado grave.
Entendimento dos Tribunais
A jurisprudência costuma considerar ilegal ou abusiva a entrega de intimações a pacientes em UTIs, especialmente quando:
- o estado clínico do paciente é grave;
- o conteúdo da intimação pode causar abalo psicológico;
- não houve avaliação prévia da equipe médica sobre a possibilidade de contato.
Responsabilidade do Oficial de Justiça
O oficial de justiça deve agir com bom senso e, se houver dúvida sobre o estado de saúde do intimado, deve consultar a equipe médica ou requerer orientação judicial antes da diligência.
Portanto, não é legalmente recomendável entregar intimação judicial a um paciente internado em UTI, salvo em casos absolutamente excepcionais e com autorização judicial específica. O respeito à saúde, à dignidade humana e à avaliação médica deve prevalecer. Se necessário, a intimação pode ser direcionada a um representante legal do paciente ou adiada até que haja condições adequadas para o ato.
Nestas circunstâncias é possível pedir a nulidade da intimação judicial realizada na UTI hospitalar a um paciente em pós-operatório, com base na legislação brasileira e em princípios constitucionais e processuais.
Fundamentação jurídica para o pedido de nulidade
1. Violação do artigo 248, §2º do Código de Processo Civil (CPC/2015)
O CPC prevê que não se deve realizar citação — e, por analogia, intimação — a pessoa doente, quando tal fato for notório ou comprovado:
Art. 248, §2º, CPC/2015:
“Não se fará a citação, salvo para evitar o perecimento do direito:
(…)
II – a quem estiver doente, se o fato for notório ou estiver comprovado por declaração de médico.”
Embora o artigo mencione “citação”, muitos juízes admitem aplicação extensiva a intimações em razão da semelhança dos efeitos e da exigência de preservação da saúde física e mental da parte intimada.
2. Princípio do devido processo legal e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV da CF/88)
Uma intimação feita sem condições reais de compreensão ou reação por parte do intimado, especialmente em um estado de vulnerabilidade física ou psíquica (como no pós-operatório em UTI), compromete o direito à ampla defesa e ao contraditório.
3. Prejuízo processual
Conforme o princípio “pas de nullité sans grief” (não há nulidade sem prejuízo), o interessado deverá demonstrar que a intimação causou prejuízo à sua defesa ou ao exercício de algum direito processual. Em um pós-operatório na UTI, presume-se a impossibilidade de reagir ou de se comunicar adequadamente, o que pode configurar esse prejuízo.
Possíveis providências:
- Petição fundamentada ao juiz do processo, requerendo a nulidade da intimação com base nos fundamentos acima.
- Apresentação de atestado ou relatório médico que comprove a condição de saúde no momento da intimação.
- Eventualmente, pedido de reanálise de prazos processuais se houver perda ou dificuldade no exercício de algum direito por conta da intimação irregular.