Em março de 2021 – quando na Alemanha o número dos casos de covid-19 crescia meteoricamente, mas os cabeleireiros já tinham permissão para reabrir e a campanha de vacinação se arrastava –, Sascha Schwartz mal podia esperar a data marcada para receber sua dose.
Assim como muitos de seus compatriotas, tomando essa injeção ele desejava recuperar um pouco da antiga liberdade, além de prestar sua pequena contribuição para a derrota da pandemia. O cidadão de Colônia se descreve na época, aos 30 anos de idade, como esportivo e ativo, sempre de bom humor, sempre cheio de energia para mais uma atividade.
Isso, até 25 de março de 2021 e a vacinação com a Astra Zeneca. De lá para cá, nada mais é como antes para Schwartz: “Nunca me senti tão indefeso e impotente como nestes últimos dois anos. É como se estivesse preso dentro do meu próprio corpo, tenho a sensação de que não existo mais”, declarou.
O que no mesmo dia começa com febre, tontura e dor de cabeça, se amplia numa história de sofrimento sem fim. Da lista que fez, com nada menos do que 96 sintomas, para Schwartz o pior de todos é o brainfog, a “névoa cerebral” que lhe tira toda concentração: ler um livro se tornou algo impensável.
“É como se a gente estivesse em piloto automático. Aquela sensação de vitalidade se foi. Tudo fica numa espécie de estado crepuscular, como se as sensações não chegassem mais até o cérebro, e a gente tivesse eletricidade ligada na cabeça”, esclarece.
Na esperança de regular os sintomas, o coloniano toma uma segunda dose em junho de 2021, com o imunizante da BioNTech, o que só piora tudo. Cuidador profissional de portadores de doenças mentais e deficiências, ao fazer uma excursão com um grupo deles num parque de diversões, ele entra em colapso, devido à sobrecarga de estímulos. Depois disso, fica acamado por semanas, totalmente esgotado, e desde então está sob licença médica.
Diagnóstico redentor — Segundo a Lei sobre Proteção de Doenças Infecciosas da Alemanha, “dano por vacinação” é a “consequência sanitária e econômica de uma deterioração da saúde causada por vacinação, que ultrapasse uma reação usual”. A repartição federal encarregada de vacinas e medicamentos biomedicinais no país, Instituto Paul Ehrlich, confirmou à DW os números relativos ao combate ao coronavírus.
Desde o início da campanha de vacinação até 31 de outubro de 2022, registraram-se 333.492 casos de suspeita de efeitos colaterais após a imunização básica mais doses de reforço, assim como 50.833 suspeitas de efeitos graves. Isso equivale a uma parcela de 0,178% e 0,027%, respectivamente, em relação a todas as doses de vacinas anti-covid ministradas no país nesse prazo.
Em relação à atual pandemia, fala-se de “síndrome post-vac”. Sascha Schwartz é um desses casos. Um ambulatório pós-vacinal da Clínica Universitária de Marburg acabou diagnosticando uma hiperinflamação do sistema imunológico em decorrência da vacinação. Mas o caminho até lá foi árduo.
“Levou meio ano até eu encontrar um imunologista que me levasse a sério e às minhas queixas. Aí eu caí em prantos na sala de espera”, recorda o cuidador de deficientes. “Até então, o que sempre diziam era: ‘É uma coisa psicossomática sua, a vacina é segura, não pode ser.’ Mesmo eu deixando claro o contexto, e que não era depressivo ou coisa do gênero.”
Para Schwartz, o diagnóstico foi a porta de saída da estigmatização. Contudo, até hoje nenhum tratamento deu resultados: 12 meses de terapia foram tão inúteis quanto a reabilitação voltada para ativação. “Uns dias atrás eu entrei de bicicleta no supermercado, coisas malucas assim. Nas fases piores, sou capaz de simplesmente ficar na cama, olhando para o teto. Quando eu acordo de manhã, meu corpo me diz como vai ser o dia. Estou até fazendo um curso de francês, uma vez por semana, mas depois, preciso ir me deitar”, revela.
Apesar de tudo, ele se recusa a se entregar ao destino, e fundou um grupo de autoajuda para habitantes de Colônia e cercanias que passaram a ter problemas de saúde graves depois de se vacinarem contra o vírus Sars-Cov-2. Neste meio tempo, já são 70 participantes que se reúnem uma vez por mês para trocar impressões. Isto é, quem pode vir, pois para muitos, às vezes é impossível sair da cama, frisa Schwartz.
Repete-se a incompreensão da covid longa — Quem queira saber qual é a atual situação dos pacientes de síndrome pós-vacinal na Alemanha, precisa conversar com Jördis Frommhold. A clínica geral e especialista em pneumologia é a maior autoridade nacional em assuntos de covid longa, já tendo tratado de milhares de atingidos, desde o começo da pandemia.
Agora, cada vez mais pacientes vêm a ela com sintomas aparecidos após a imunização. Ela acaba de atender um homem de 35 anos que, depois da segunda dose, apresenta dificuldades respiratórias e exaustão generalizada. Mas trata-se também de um problema de aceitação. “Os pacientes com síndrome post-vac são realmente colocados nesse canto dos antivacinas e adeptos de teorias de conspiração, não são nem um pouco levados a sério”, constata a médica. No fundo, repete-se a odisseia dos afetados pela covid longa, que de início foram tratados com incredulidade: falta aceitação.
“É uma pena a gente não ter aprendido nada; que – a todo mundo com problemas que não são compreensíveis à primeira vista – se diga: ‘Isso não existe.’ Com certeza, essa é a abordagem errada”, critica Frommhold. Ela não admite que “alguém que às 9 horas da manhã recebeu a vacina adaptada para a variante ômicron, e que às 20 horas apresenta orelhas vermelhonas, inflamadas, tenha que escutar: ‘Não pode ser, não tem relação.'”
A posteriori, pergunta-se: será que a Alemanha deveria ter adotado uma outra estratégia de vacinação? Não, assegura a internista: a meta prioritária era dar fim à pandemia de covid-19, e também evitar casos graves da doença. Não se deve esquecer que as UTIs estavam lotadas, e que muitas mortes poderiam ter sido evitadas. Portanto é importante muitos terem recebido os imunizantes, enfatiza a doutora Jördis Frommhold.
No entanto, após cada vacinação há, infelizmente, o risco de efeitos colaterais: “Não se trata de um caso extraordinário. Simplesmente, como aplicamos um número muito alto de doses, temos um grande número absoluto de pacientes com efeitos colaterais – mesmo que as percentagens sejam baixas. É preciso cuidar dessas pessoas.”
Autor: Oliver Pieper, para DW